Destaque

NOTA: COVID-19 E A POPULAÇÃO INDÍGENA

Ao pensarmos a COVID-19 e sua relação com as comunidades indígenas, nos deparamos com inúmeras problemáticas que as colocam como população de risco e que precisam ser discutidas de forma urgente para deliberação de ações de curto e longo prazo. Dentre elas, frente a pandemia temos a precarização do sistema de saúde, que afeta todas as comunidades, principalmente aquelas que vivem em locais de difícil acesso. Os desmontes promovidos mais gravemente pelo governo federal nos últimos anos, como no decreto 9.795/2019, contribuem para que a assistência à saúde seja cada vez mais falha, o que, em tempos de COVID-19, dificulta o diagnóstico e o tratamento em caso de contágio.

De acordo com o último censo feito pelo IBGE (2010), estamos falando de um Brasil indígena, com uma população de quase 900 mil pessoas distribuídas pelas cinco regiões do país, em aldeias mais isoladas, como é o caso de algumas localizadas na Região Amazônica, e outras menos afastadas dos grandes centros, bem como, comunidades indígenas em centros urbanos. Em Alagoas, de acordo com o governo estadual, contamos com 12 comunidades indígenas, totalizando 10.771 entre índios em aldeias urbanas e residentes em terras indígenas. Independentemente da pandemia essas populações são submetidas a constantes ataques e flexibilização das legislações que deveriam proteger seus direitos já estabelecidos pela Constituição Federal brasileira (1988), o que acarreta o acirramento dos conflitos pela terra, negligência no acesso a direitos básicos e violência sistemática sobre lideranças e comunidades. Tudo isso fragiliza os povos indígenas diante da precarização dos serviços de saúde e o acesso insuficiente a recursos formais o que aumenta a vulnerabilidade em saúde das comunidades no enfrentamento ao Coronavírus.

Segundo Sofia Mendonça, médica sanitarista e pesquisadora pela USP, “há um risco incrível de o vírus se alastrar pelas comunidades e provocar um genocídio” (MENDONÇA, p.1, 2020). Mesmo partindo de um pressuposto que as comunidades indígenas são plurais e cada uma tem sua organização interna, existem características predominantes na maioria delas, como as reuniões comunitárias e o contato entre si, o que pode contribuir para a proliferação do vírus caso alguém esteja infectado. Devido a isso, os casos já identificados mostram que a contaminação cresce de forma exponencial e preocupante, principalmente quando uma das principais populações de risco são as pessoas idosas, que na cultura indígena são os líderes comunitários e os principais detentores dos saberes ancestrais.

Segundo o boletim epidemiológico da Secretaria Especial de Saúde Indígena (SESAI), o número de indígenas diagnosticados com o COVID-19 até o dia 28/04/2020 foi de 92, em sua maioria no estado do Amazonas, no nordeste os primeiros casos são nos estados de Pernambuco e Ceará. Para Mendonça (2020), levando em conta o risco para as populações indígenas, é necessário o máximo de isolamento possível para que o vírus não chegue às aldeias, bem como o extremo cuidado por parte das pessoas que estão tendo acesso às cidades e voltando para as aldeias.

No que tange a Psicologia, muito se vem debatendo sobre a saúde mental e o papel da psicologia durante a pandemia, principalmente no que diz respeito aos impactos do isolamento social, e como os profissionais podem se adaptar à atual conjuntura. Entretanto, ao pensar nos povos indígenas se fazem necessárias novas reflexões que levem em consideração as especificidades de tais comunidades, pois nem sempre as “soluções” propostas são acessíveis aos mesmos, atendendo aos preceitos das políticas públicas de saúde destinadas a esses povos. A nós caberá dialogar e acolher as demandas surgidas das necessidades próprias de cada comunidade indígena. Nós, psicólogas/os, reafirmamos nosso compromisso social com os povos indígenas, em especial os do Estado de Alagoas, nesse contexto de pandemia e manifestamos o apoio do CRP-15, através da sua Comissão de Direitos Humanos, a todas as iniciativas provenientes das aldeias em prol da saúde mental de suas populações.

Texto: Comissão de Direitos Humanos do Conselho Regional de Psicologia (CRP-15)

Fotos: Ju Barreto

Comunidade indígena Karuazu – Pariconha (AL)